Um dos conceitos
mais difundidos do mundo empresarial na década de 90 e que permanece até hoje é a Pró-Atividade. Este conceito foi muito bem
ilustrado no clássico livro “Os 7 hábitos das pessoas muito eficazes” de
autoria de Stephen Covey.
De acordo com Covey,
a Pró-Atividade é muito mais do que tomar a iniciativa. Significa que nós somos os responsáveis por nossas vidas e que nosso
comportamento resulta de nossas decisões e não das condições externas.
Covey resgatou este
conceito através dos ensinamentos do psiquiatra austríaco Viktor Frankl, prisioneiro de um campo de extermínio nazista durante
a 2ª Guerra Mundial, cuja experiência está relatada no livro “Em busca de Sentido”.
Apesar de todas
as humilhações e privações pelas quais Frankl foi submetido, ele sabia que o que importava era a liberdade de escolha de sua
reação diante destas condições externas e extremas. Entre o estímulo e a resposta encontra-se o livre arbítrio, ou seja, a
liberdade de escolha do ser humano.
Em sua
experiência, Frankl viu que muitos prisoneiros desistiam de viver por não encontrar um sentido nesse sofrimento. Transcrevemos
uma passagem interessante deste livro a seguir: “A desvalorização total da realidade,
oriunda da forma provisória de existência do recluso, acaba seduzindo a pessoa a entregar os pontos completamente, a abandonar-se
a si mesma, visto que de qualquer forma “tudo está perdido”. Essas pessoas estão se esquecendo de que muitas vezes
é justamente uma situação exterior extremamente difícil que dá a pessoa a oportunidade de crescer interiormente para além
de si mesma. Em vez de transformar as difuldades externas da vida no campo de concentração numa prova de sua força interna,
elas não levam a sério a existência atual,
e depreciam-na para algo sem real valor. Preferem fechar-se a esta realidade, ocupando-se apenas com a vida passada”.
Em seguida Frankl cita outra passagem: “Quem
não consegue mais acreditar no futuro – seu futuro – está perdido no campo de concentração. Com o futuro, tal
pessoa perde o apoio espiritual, sucumbe interiormente e decai física e psiquicamente.”
Frankl propõe um
novo jeito de se perguntar pelo sentido da vida e cita: “Precisamos aprender
e também ensinar às pessoas em desespero que a rigor nunca e jamais importa o que nós ainda temos a esperar da vida, mas sim
exclusivamente o que a vida espera de nós”.
E em
última análise: “viver não significa outra coisa que arcar com a responsabilidade
de responder adequadamente às perguntas da vida, pelo cumprimento das tarefas colocadas pela vida a cada indivíduo, pelo cumprimento
da exigência do momento”.
A mensagem de Frankl
propõe uma postura otimista de vida mesmo diante um regime totalitário, como foi o nazismo. E ainda hoje podemos nos defrontar
com situações nebulosas, quer seja na esfera governamental como na empresarial, que mais se parecem com regimes totalitários.
Muitas vezes em
nossa empresa sentimos dominar um certo clima de medo diante certas questões, o que parece característico de um regime totalitário. Para ilustrar o questionamento
levantado, devemos recorrer a um dos meios de comunicação mais poderosos em nossa companhia, que é a chamada “rádio
peão”, veículo informal de notícias e com velocidade de propagação muito mais rápida que a Internet. Muitas “reportagens”
são propagadas pela “rádio peão”, mas as que chamam atenção para esta matéria são aquelas em se contam retaliações
(como ameaças de demissão e perda de cargo de gerente) contra funcionários que procuraram, de forma honesta, defender posições
técnicas em assuntos polêmicos como flotação do Rio Pinheiros, traçado do Rodoanel, racionamento de água na RMSP etc.
Não vamos discutir
a veracidade ou não de certas notícias veiculadas na “rádio peão”, o que queremos debater é o fato de se constatar
uma ausência de livres debates produtivos de certos assuntos dentro da companhia ou mesmo em outros veículos de comunicação,
como no Sindicato dos Engenheiros, ABES, CREA etc.
Falar
abertamente destes assuntos polêmicos traz o mesmo medo que os bruxos de Harry Potter têm em relação ao bruxo do Mal, Voldemort,
cujo nome é evitado até mesmo de ser pronunciado, preferindo-se designar por “Você Sabe Quem”.
Neste
clima de medo, muitas coisas tornam-se segredo. Assim é interessante citar o filósofo Karl Jaspers no que diz a respeito de
segredos no campo da política: “Entre cidadãos que constroem, aperfeiçoam e velam
por sua liberdade comum, não há por que existir segredo. Quando o segredo existe, algo não corre bem.”
E o
que estaria por detrás dos segredos? “O adversário da verdade é o desejo de poder.
O desejo da verdade nos impele a revelar, o desejo de poder nos impele a ocultar. Se abolíssemos o desejo de poder, deixaria
de existir a tendência de esconder.”
E como
se caracteriza este desejo de poder? “O desejo de poder mais facilmente assume
os contornos da verdade quando, por trás, se põe o desejo de violência. Violência por superioridade intelectual, por contestação
orgulhosa, por ameaças, por enganos.”
Quando há um clima
de incerteza muito grande dentro da companhia, alimentada através das “fofocas” e murmurações, acabamos caindo
num conformismo derivado de nossa falta de Pró-Atividade.
Ainda de acordo
com Jaspers, “num povo livre, a opinião pública é o forum da política. O grau
de informação de que a opinião pública disponha é o critério de liberdade desse povo. O que determina o destino de todos,
deve, por exigência da liberdade política, passar-se em público . A reflexão deve ser pública e preparada em público a decisão. A concordância brotará dessa base e não da confiança cega.” Portanto, devemos
ter a Pró-Atividade para dispersar as nuvens de incertezas e levantar o debate de vários assuntos de interesse público, caso
contrário não seremos capazes de saber se há realmente um “Você Sabe Quem” por trás de certas questões.
Nós somos os responsáveis
pelo nosso futuro e da companhia. De nada adiantará chorar e nos fazer de vítimas devido a circunstâncias externas ou de circunstâncias
que são frutos de nossa mirabolante imaginação. Nós colhemos o que nós próprios semeamos, quer seja em questões minúsculas
como em situações polêmicas.
O discurso
da Pró-Atividade também pode ser utilizado de forma manipulativa como um instrumento de domínio sobre a força de trabalho.
Assim necessita-se cultivar a Pró-Atividade de modo a preservar a nossa integridade repudiando abertamente situações como:
trabalhar 12 horas por dia com a desculpa de ser um desafio profissional; aceitar responsabilidades de contrato não compatíveis
com o cargo; ficar com a consciência intraquila nas férias, como se fosse algo proibitivo; aceitar ordens do “Você Sabe
Quem”, do tipo “tem que fazer por que tem que fazer” e depois
virar um “laranja” etc.
Enfim, precisamos
cultivar o valor da Pró-Atividade dentro da liberdade do regime democrático, de forma a construirmos um mundo cada vez melhor.
E neste mundo melhor, temos consciência de que nosso papel na sociedade é de extrema responsabilidade em questões como meio
ambiente, saúde pública e recursos públicos.